Três pancadinhas na porta.
Ela perguntou quem batia, mas não
obteve resposta. Perguntou novamente. Nada.
Mais três pancadinhas.
Sem muita paciência abriu a porta. Assustou-se,
pois era seu marido. Ele não era dado a esse tipo de brincadeira. Na verdade,
de brincadeira nenhuma! Estava sempre com um ar aborrecido e impaciente. Mas
não hoje.
Uma das mãos escondia algo atrás, nas
costas. Sorriu e estendeu-lhe um buquê.
Ela ficou parada olhando...
- Não vais pegar?
- Oi?! – perguntou atônita.
- Não vais pegar o buquê? Não te agradam
essas flores?
- Sim, sim! Claro! Desculpe-me! Entre.
- Depois de você, querida.
“Querida”?! Ele não a chamava assim
desde... Desde muito tempo!
Entrou. Colocou as flores em um vaso.
- A noite está linda, não?! –
perguntou-lhe com um ar excitado.
Ela, mais uma vez, ficou sem saber o
que responder. Ele sempre chegava reclamando de tudo: trânsito [mesmo que não
houvesse], calor, economia do país, do patrão ou do subordinado ou qualquer
outra coisa que fosse possível! Mas, naquela noite, estava sorridente e
atencioso. Então, restou a ela apenas acenar com a cabeça confirmando que a
noite estava mesmo bonita.
Sem jeito, saiu da sala para deixá-lo
só assistindo a TV, como gostava. Na cozinha, foi surpreendida com ele ao seu
lado estendendo a mão para fazer-lhe um carinho.
- A noite está realmente linda! Não
queres passear? – perguntou carinhosamente.
Definitivamente, ela não entendia o
que acontecia com seu esposo, mas resolveu aproveitar toda aquela simpatia e
assentiu. Correu até o quarto para trocar-se. Abriu o guarda-roupa e fitou o
longo vestido vermelho que há muito não usava. Segurou-o e seu cheiro invadiu o
quarto.
Ele a esperava na sala. Quando ela
apareceu à porta, era outra mulher. Belíssima em seu longo vestido decotado. Os
olhos dele brilharam, foi até ela e beijou-lhe a mão e ofereceu-lhe o braço
para que ela segurasse.
Passeavam na praça como um casal de
jovens cheios de amor e graça.
Algum tempo depois, perceberam que já
era tarde e não havia mais ninguém lá, mas não sentiam vontade de ir embora.
Após alguns abraços calorosos seus
corpos começaram, lentamente, a mover-se de um lado para o outro. Ao som do
silêncio, dançaram como nunca antes ousaram fazer.
Ela lembrou-se de quando os dois,
ainda namorados, dançavam nas festas de família. Recordava do som dos bandolins
tocados por seu pai e irmão. Lembrou-se de sua juventude e de seu sonho em ser
bailarina, mas por amor, abandonou o sonho para ficar ao lado do esposo. No
entanto, ali, ela girava, girava, girava, apertava seu corpo contra o dele e
depois rodopiava.
Aos beijos, abraços e gritos de
felicidade os dois faziam juras de amor eterno um ao outro. Os vizinhos
acordaram com tanto barulho e, aos poucos, acendiam as luzes de suas casas e abriam as janelas
para ver o que a acontecia e a praça ficou iluminada, mas ninguém foi capaz de
repreender aquele casal apaixonado que transbordava amor.
Quando, ao longe, a alvorada despontava, o dia
parecia amanhecer em paz.(*) conto inspirado nas músicas "Valsinha" e "Bandolins".
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